Mortalidade de MPEs e MEIs ainda é alta. E pode piorar
24/06/2019

 

Presidente em exercício da Federação das Associações de Micro e Pequenas Empresas e Empreendedor Individual (Fampesc), Rosi Dedekind está entre as empresárias mais atuantes do estado. Empreendedora dos ramos de hotelaria e de alimentação, ela vê no associativismo a melhor forma de encontrar soluções para problemas comuns aos empresários do segmento.

Por isso, hoje comanda uma entidade que reúne 22 associações de representação de Micro e Pequenas Empresas e Empreendedores Individuais do estado. Na soma, são mais de 50 mil empresas.

Rosi Dedekind concedeu essa entrevista exclusiva à reportagem da ADI-SC para falar das dificuldades e dos avanços para o segmento. E para chamar a atenção de que empreender não é alternativa para desemprego.

 

“Empreender é um risco. Não só no Brasil. No mundo todo.

Se você não está preparado, está se arriscando.”

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[PeloEstado] – No pior momento da crise, o segmento representado na Fampesc foi o que segurou os empregos. Com esta responsabilidade, recebe a atenção merecida por parte do poder público?

Rosi Dedekind – Não. Não recebe. Hoje, na esfera federal, está melhorando um pouco. Eu diria que está apenas começando o reconhecimento do mérito da micro e pequena empresa (MPE) e microempreendedor individual (MEI). As medidas provisórias (MPs) que estão sendo publicadas, como a de liberdade econômica. Por essa MP, o empreendedor pode começar a empreender para depois, já gerando receita, obter as licenças.  É um incentivo a novos empreendedores. A MP também permite que pessoas físicas emprestem recursos financeiros aos empresários desse porte. São soluções que ajudam os pequenos, que não têm acesso aos bancos.

 

[PE] – E em âmbito estadual?

Rosi – Também temos algum reconhecimento. Mas é necessário que os avanços determinados em âmbito federal cheguem ao Estado e municípios. Não adianta nada uma medida provisória federal que não é acatada nas outras esferas. Agora temos que aproveitar a carona, batalhar junto ao Estado e municípios, para que se possam aplicar as inovações que estão chegando. Especialmente nos municípios, onde estão os maiores entraves.

 

[PE] – Por exemplo?

Rosi – É a liberação para funcionamento propriamente dita. Abri agora um bistrô para meus filhos e levei 52 dias para poder abrir as portas. Durante todo esse tempo nós tivemos gastos, com equipe, aluguel, energia, e sem gerar receita. O ideal é que ocorra como a MP da liberdade econômica sugere. Prepara o negócio, abre as portas e vai encaminhando a parte burocrática já com rendimento. E a cada fiscalização, o que não estiver correto passará por ajustes.

 

A alternativa é trabalhar na ilegalidade,

o que não é bom para ninguém.

 

[PE] – A mudança no governo estadual e no comando da Secretaria de Desenvolvimento Econômico Sustentável, agora com o secretário Lucas Esmeraldino, já trouxe algum avanço?

Rosi – A retomada do Fórum Estadual da Micro e Pequena Empresa foi um pedido nosso. Mostramos que era necessário porque em Brasília tem o Fórum Permanente da Micro e Pequena Empresa. A ligação entre os dois níveis precisa existir para que o que se aprova lá aconteça aqui. Ficamos bem contentes porque eles foram a Brasília, participaram de reunião do Fórum Permanente e confirmaram a necessidade de uma instância estadual. Depois, em 30 de março, participaram do nosso Encontro Estadual das MPEs de Santa Catarina quando foi reativado o Fórum Estadual.

 

[PE] – Na primeira resposta a senhora falou em mais acesso a crédito. O que precisa mudar sobre isso?

Rosi – Hoje, um empreendedor de micro e pequena empresa, ou micro empreendedor individual, vai a um banco comercial e sai de lá de mãos abanando, porque essas instituições exigem garantias inviáveis para o nosso segmento. Mesmo nos bancos de fomento a burocracia é muito grande e trava tudo. Com a liberação da pessoa física poder abrir empresa de crédito, isso vai mudar. Eu, pessoa física, vou poder emprestar para um amigo o recurso que ele precisa para abrir uma pequena empresa, sem cair no estigma da agiotagem.  Isso vai provocar os bancos comerciais e os de fomento a facilitarem os processos. Mesmo uma empresa de médio porte tem dificuldades para atender todas as exigências.

 

[PE] – As Instituições de Microcrédito Produtivo Orientado (IMPOs, antigas Oscips) não facilitam nesse caminho?

Rosi – Às vezes, sim. Mas no dia a dia do empreendedor, principalmente do nosso segmento, ainda tem muita burocracia. Tenho cinco, seis funcionários que preciso pagar, mas meu cliente atrasou o pagamento dele, eu preciso de dinheiro rápido e não tenho onde buscar! Esses processos precisam ter a mesma agilidade que nós, de micro e pequenas empresas, temos que ter. É muito diferente de uma grande empresa, que precisa comprar uma máquina de R$ 1 milhão. Ela tem espaço para fazer uma programação e estrutura operacional para dar conta das exigências do sistema bancário.

 

[PE] – Como está o índice de mortalidade de MPEs e MEIs em Santa Catarina?

Rosi – Ainda é alto. Mas houve uma mudança nisso, justamente porque as associações que compõem a Fampesc estão mostrando a necessidade de se preparar para abrir uma empresa. Não é uma decisão só por vontade ou ocasião. Envolve muitas coisas. Não sei estimar em números, mas a fase mais crítica são os dois primeiros anos. A gente comemora quando passa de um e comemora mais ainda quando chega aos dois (risos).

 

Por isso estamos sempre trabalhando questões como

sustentabilidade empresarial, inovação, uso de tecnologia.

 

[PE] – Empreender é uma alternativa ao desemprego?

Rosi – É uma alternativa, sim. Mas é perigosa. Essa grande leva que perdeu seus empregos formais não está se preparando nem para voltar ao mercado de trabalho, nem para ser empreendedor. Isso pode gerar uma alta no índice de mortalidade de empresas por conta disso. Nesse universo de mais de 13 milhões de desempregados, quantos de fato têm perfil empreendedor? Não é só. As empresas perceberam que continuam funcionando com um, dois, três, dez funcionários a menos. Para sentir falta desse pessoal será preciso um aumento de demanda. Por isso os desempregados têm que buscar emprego, sim, mas, ao mesmo tempo, buscar capacitação, atualização de técnicas e tecnologia.

 

[PE] – A Fampesc e o Sebrae são parceiros para tentar mudar essa realidade?

Rosi – Nossa parceria com o Sebrae é ótima. Nós temos o programa de Núcleos Setoriais nas 22 associações. São empresários que sentam juntos para resolver problemas comuns a todos, desde capacitação até uso de uma nova tecnologia. Nesses espaços não há concorrentes e, sim, colaboradores uns dos outros. Nessas ocasiões, o Sebrae e a Fampesc apresentam números, trazem experiências de outras regiões e, é claro, ouvem as demandas. Eu, por exemplo, faço parte do Núcleo de Turismo da Ajorpeme. Agora estamos nos dedicando, com o apoio do Sebrae, a desenvolver o Turismo Cervejeiro no estado, capacitando as cervejarias para receberem visitantes. Nosso Núcleo de Contabilidade é outro exemplo de sucesso. Eles se reúnem há 17 anos, estudam as leis, as regras. Eles se organizam, se fortalecem e chegam a propor leis. E esses núcleos locais ou regionais participam de um ou dois encontros estaduais por ano, onde definimos prioridades e estratégias. Temos que ficar permanentemente atentos para as mudanças, cada vez mais rápidas.

 

[PE] – Qual a região de Santa Catarina que concentra o maior número de MPEs e MEIs?

Rosi – Segue a proporção da ocupação espacial do estado. Então, a maior concentração de micro e pequenas empresas e microempreendedores individuais está em quase toda a faixa litorânea catarinense, de Joinville a Tubarão, e no Vale do Itajaí. Mas, mesmo que em menor incidência, todas as regiões têm MPEs e MEIs e em todas a importância do segmento para manter a economia girando é grande.

 

 

 

O mundo ideal segundo Rosi Dedekind

– Menos burocracia

– Acesso facilitado ao crédito

– Mais produtividade

– Mais qualidade

– Formação e capacitação

– Acesso à tecnologia e inovação

 

Por Andréa Leonora

Fotos: Divulgação Fampesc

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