Governo não vai revogar decretos que suspendem benefícios tributários

14/02/2019 – “O Executivo usurpou uma atribuição da Assembleia.” Quem afirma é o secretário de Estado da Fazenda, Paulo Eli, ao explicar os vários motivos que levaram à elaboração e publicação de três decretos que mexem com benefícios e isenções fiscais. A gritaria com o consequente aumento da alíquota de ICMS, o que se reflete nos preços finais ao consumidor, tem sido grande desde a publicação das medidas, tanto da parte de políticos quanto do setor produtivo. Mas Eli garante que não há alternativas e que os decretos não serão revogados. Pelo menos não por iniciativa do governo.

 

Munido de documentos do Tribunal de Contas (TCE-SC) e do Ministério Público (MP-SC), ele destacou que a receita pública é indisponível, ou seja, “ninguém pode roubar e dela ninguém pode renunciar”, a menos, neste último caso, que sejam seguidos os preceitos legais para tal. Entretanto, para manter a competitividade de diferentes segmentos da economia catarinense, o Estado adotou a política de guerra fiscal. Em função do excesso de renúncia de receitas ao longo de anos, e sem que fossem atendidos os preceito legais, em 2016 o TCE-SC iniciou procedimento contra o governador Raimundo Colombo e os ex-secretários Antonio Gavazzoni e Nelson Serpa.

 

No dia 8 de maio de 2018, o Tribunal proferiu decisão informando que foi constatada a emissão excessiva de decretos de renúncia fiscal – que somaram R$ 6,3 bilhões só em 2016 -, e determinando que o Estado revogasse todos os decretos que concediam benefícios sem a devida autorização do Legislativo, etapa prevista em lei. “Por isso afirmo que o Executivo usurpou uma atribuição da Assembleia. É necessário que o Estado corrija isso, porque é o certo a se fazer e porque assim foi determinado pelo TCE”, defendeu o secretário.

 

A notificação do Tribunal de Contas ainda determina que os decretos antigos, de governos anteriores, também devem ser revogados. O corpo técnico da Secretaria da Fazenda está focando, por enquanto, em decretos com este teor publicados de 2003 a 2017.

 

Reação

 

A Assembleia reagiu à usurpação de atribuição sua por parte do Executivo e impôs um limite na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 16% para ações de renúncia fiscal, índice que estava em 25%. “O que fizemos foi buscar o enquadramento na lei e na nova realidade”, resumiu.

 

Em outro processo, também do ano passado, o TCE-SC faz outras acusações contra o Executivo: ausência da prestação de contas das renúncias fiscais, ausência de avaliação sistemática dos resultados de benefícios fiscais e acobertamento de dados pela Secretaria da Fazenda. E não para por aí.

 

Mais um processo, dessa vez do Ministério Público, exige a retirada da isenção para os agrotóxicos. Ao determinar isso, o MP-SC segue a Constituição Federal quando determina que o custo dos produtos deve refletir o impacto ambiental que causam. “E o Estado estava concedendo alíquota zero para o agrotóxico! O MP determinou a revogação da isenção e nós cumprimos o determinado”, completou Eli.

 

Foto: Agência Brasil

O secretário rechaça o pânico que vem sendo gerado por parte do setor produtivo, que aponta o risco de fuga de empresas para outros estados, especialmente nessa primeira fase da revisão dos benefícios, durante a qual só serão avaliados o que chamou de “produtos de supermercados”. São mais de 80 mil itens. Ao mesmo tempo, considera natural a reação negativa, uma vez que só em 2019 devem ser retirados R$ 750 milhões das ações de incentivo fiscal, chegando aos R$ 2 bilhões a menos determinados pela Assembleia até 2022.

 

Todos os dias o secretário Paulo Eli recebe grupos de empresários e entidades de diferentes setores e regiões. “A maioria entende as nossas limitações, mas resiste porque não quer perder o benefício. Natural. Mas estamos cumprindo o que o TCE, o MP e a própria Assembleia determinaram. E eles o fizeram preocupados com o equilíbrio financeiro de Santa Catarina. Para se ter uma ideia, o déficit estimado para este ano é de R$ 2,5 bilhões”, comparou. E acrescentou que “o resto é sonegação fiscal que eu tenho que pegar”, uma prática que, de acordo com levantamentos feitos em nível nacional, equivale a 20% do Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, de toda a riqueza produzida em Santa Catarina, 20% não são tributados.

 

Pela complexidade da situação, ele acha coerente que sejam atendidas as solicitações de deputados e do setor produtivo para que tenham assento no Grupo de Trabalho que avalia as renúncias concedidas ilegalmente. “O princípio aqui, exposto coerentemente pelo TCE, é que a Assembleia é soberana.”

 

Na Assembleia

A reação tem sido dura no Legislativo estadual, com discursos inflamados e a garantia de que os três projetos serão vetados. O argumento mais forte é que as mudanças vão onerar os produtos da cesta básica, atingindo as camadas mais empobrecidas da população.

 

Para sair do debate midiático, o presidente da Casa, deputado Julio Garcia, marcou para as 16 horas da próxima terça-feira (19), a convocação do secretário da Fazenda, Paulo Eli, para prestar esclarecimentos sobre as medidas. A iniciativa partiu dos deputados Moacir Sopelsa e Valdir Cobalchini, ambos do MDB, em Requerimento aprovado na sessão plenária de terça-feira (12).

 

Outra tentativa de solucionar o caso sem desgastes maiores é do deputado Coronel Onir Mocellin (PSL), líder do governo na Assembleia. Ele propõe um projeto de lei para revisão dos incentivos, o que na prática já está sendo feito, e defende que as entidades empresariais tenham suas manifestações consideradas. Entretanto, confirmou que, segundo estudo da Procuradoria Geral do Estado, o Executivo não pode revogar os decretos, pois incorreria em improbidade administrativa.

 

Por Andréa Leonora – CNR-SC/SCPortais-SC/ADI-SC

Matéria compartilhada com os veículos da ADI-SC e da Adjori-SC